sexta-feira, 11 de março de 2011

LITERATURA LATINA (XXI): A PROSA CLÁSSICA, ERA DE CÍCERO - ELOQUÊNCIA (8ª PARTE)

MARCO TÚLIO CÍCERO


ESTILO

O estilo é, por excelência, clássico, possuindo como notas a naturalidade, a veracidade e a maleabilidade. É de extrema correção e pureza, e além do mais é musical, harmonioso, incomparável a qualquer outro estilo na prosa latina, e mesmo ultrapassando, pode-se afirmar, aos prosadores gregos, com exceção de Isócrates.

No entanto, é de se admirar mais a variedade do que a perfeição. Cada série de obras tem seu caráter geral. As cartas, por exemplo, são repletas de sinceridade, com palavras selecionadas e de menor rigor, expressão mais natural e viva. Os discursos, por sua vez, possuem vigor e atingem o apogeu com a riqueza do ritmo. Os tratados estão a meia distância entre os discursos e as cartas. A diversidade perpassa cada grupo de obras, e em cada obra do mesmo grupo. Muitas vezes as cartas são eloquentes e os discursos descem ao tom familiar. 

Por toda parte das obras ciceronianas há matizes de expressão leves e delicados. Quem pensa ser Cícero solene de maneira uniforme, não o compreendeu.

EVOLUÇÃO

Cícero não atingiu a perfeição de uma só vez. Nos seus primeiros discursos há falhas de estilo, que mais tarde soube evitar, reconhecendo mesmo ter sido primeiro frondoso e até mesmo declamatório. De início estava longe de possuir perfeita habilidade no manejar do ritmo e do período. Somente pouco a pouco que se tornou mestre.

O purismo também sofreu progresso, pois certas expressões familiares que, de início, admitia por negligência, progressivamente desapareceram. Claro que a língua familiar ainda aparece aqui e ali, porém empregada com maestria, com a finalidade de produzir determinado efeito, para dar à palavra mais naturalidade, mais ironia ou sarcasmo.

A maleabilidade, o desembaraço, a facilidade em passar de um a outro tom, a variedade, são muito maiores nos discursos da maturidade que nos primeiros ensaios.

CARÁTER GERAL DAS OBRAS

Tais obras valem acima de tudo pelo estilo, nunca ninguém contestando a beleza da forma.

Outro interesse, entretanto, oferecem. Embora não tenha sido Cícero o maior gênio da antiguidade, é aquele cujas obras apresentam o mais completo quadro da civilização greco-romana. Nelas se encontra a História e as Instituições Romanas juntamente com a sabedoria grega. É por esse motivo que os pesquisadores de certa erudição sobre a antiguidade se valem dele e o citam.

Se como orador não é tão comovente como quanto Demóstenes, excede-lhe em vantagem na extensão dos conhecimentos. Seu horizonte é bem menos limitado, mas bem mais aberto o seu espírito. Não é apenas o maior orador de Roma: é o maior homem de letras da antiguidade. "É o maior literato de todos os tempos", chegou a dizer Sainte-Beuve, grande crítico literário francês do século XIX.

Em extensão material, as obras de Cícero, conhecidas hoje, são, por si sós, mais consideráveis que as que nos ficaram de César, Salústio, Tito Lívio, Tácito e Suetônio.

REPUTAÇÃO

Cícero, já em vida, teve inimigos literários, como os neo-áticos, porém maior era o número dos admiradores, sendo César um deles. As duas correntes de opinião, no entanto, coexistiram, mas prevalecia a dos admiradores. Mesmo Licínio escrevendo o panfleto Ciceromastix, Chicote de Cícero, não o impediu que visse nele o prosador por excelência excelência. Quintiliano disse: "Non immerito ab hominibus aetatis suae regnare in iudiciis dictus est, apud posteros vero id consecutus, ut Cicero non hominis nomen, sed eloquentiae habeatur" (X,1,112). Santo Agostinho indaga: "Quid in lingua latina excellentius Cicerone inveniri potest?" (De magistro, V, 16). 

Foi Cícero menos lido na Idade Média, naturalmente, que na Idade Antiga, mas pode-se afirmar que é um dos raros autores que não caiu em esquecimento em nenhuma época.

Na Renascença o entusiasmo por ele chegou ao paroxismo: os "ciceronianos" caíram no ridículo por imitação servil, mas os grandes inimigos destes, como Erasmo, não menosprezaram Cícero.

No século XVII, não só constituem seus discursos o principal objeto dos estudos nas escolas, mas mesmo oradores, como Bourdalane, recomendam sua leitura aos pregadores.

No século XIX, as investidas de Mommsen contra o Orador produziram alguns sulcos na opinião, porém uma reação produziu-se, e no século XX voltou-se a formar de Cícero juízo mais favorável e que permanece até nossos dias.
Paulo Barbosa

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