quarta-feira, 16 de março de 2011

LITERATURA LATINA (XXV): A PROSA CLÁSSICA, ERA DE CÍCERO - HISTORIOGRAFIA [3ª PARTE]

CAIO SALÚSTIO CRISPO

BIOGRAFIA

SALÚSTIO (85-35? a.C.), nascido em família plebéia em Amiterno, na Sabínia. Desde cedo pensou em escrever sobre História, mas foi levado à vida política. Após ter sido questor, ignorando-se a data, foi tribuno da plebe em 52. Pertencia ao partido popular e, por ocasião do assassinato de Clódio, em 52, proferiu violentos discursos contra Milão e Cícero.

Em 50 foi expulso do senado pelo censor Ápio, em razão dos seus maus costumes.

César, de quem era partidário, o nomeia questor, voltando ao Senado em 49. Em seguida foi incumbido de várias expedições militares, tendo sido enviado por César à Campânia para sufocar a revolta das legiões, e não conseguindo, foi quase assassinado.

Em 46, César o fez procônsul na África, e daí trouxe Salústio os documentos para a composição da História de Jugurta e também muito dinheiro. Foi acusado de concussão, mas achou meios de ser absolvido. No Quirinal mandou edificar um suntuoso palácio rodeado de esplêndidos jardins. Viveu, então, dez anos afastado dos negócios públicos, dedicado a escrever trabalhos historiográficos. Casou-se com Terência, a esposa que Cícero repudiou, e que após Salústio, casou-se mais vezes. 

OBRAS

O Corpus Salustianum é constituído das seguintes obras:

1. DE CONJURATIONE CATILINAE, ou talvez BELLUM CATILINAE, que apareceu, provavelmente, pouco depois da morte de César, em 43 ou 42. Após um preâmbulo filosófico e a introdução que resume a história romana desde a época de Enéias, começa Salústio a narrar os preliminares e finalmente a própria conjuração de Catilina.

Comete alguns erros, seja pelo fato de citar de memória sem nenhuma verificação às fontes, seja mesmo de propósito. Não é um autor imparcial. Pretende diminuir a importância de Cícero, embora sob a capa de lhe fazer justiça o nomeia de optimus consul. Acerca de César, apresenta-o como não comprometido com a conspiração, e segundo autores, bem pode ser essa justificação de César, seu amigo, o objetivo de seu trabalho monográfico.

2. BELLUM IUGURTHINUM, de data incerta, mas composto depois do De Conjuratione, e antes das Histórias. Começa também, como o precedente, com uma introdução filosófica e em seguida relata a guerra de Roma contra Jugurta, rei dos númidas (112-106 a.C.). É bem mais elaborado que a monografia anterior, porém ainda está longe de alcançar a perfeição, ressentindo-se de numerosas inexatidões. Tem por finalidade esta obra demonstrar a corrupção da aristocracia romana e indiretamente justificar o partido democrático.

3. HISTORIARUM LIBRI V, última e mais importante obra de Salústio, composta provavelmente depois do ano 39. Narra-se aí os acontecimentos ocorridos entre 78 e 67 a.C. Está quase totalmente perdida esta obra, conservando-se apenas alguns fragmentos, dos quais os mais longos são quatro discursos e duas cartas.

Também foram falsamente atribuídas a Salústio duas cartas a César e uma invectiva contra Cícero.

O HISTORIADOR SALÚSTIO

Salústio imita Tucídides e, como este, procura as causas dos acontecimentos. É autor de História política, não possuindo, contudo, nem imparcialidade, nem o gênio perscrutador e profundo do grande historiador grego. Escreve para provar uma tese: pretende justificar o partido democrático e difamar a aristocracia.

Para ele as ideias têm mais importância que os fatos: numerosas sentenças são encontradas no meio das narrações; os prólogos de seus livros são sempre filosóficos, onde se pode descobrir a influência de Posidônio, sábio que possuía escola em Rodes frequentada por Cícero. Seus elogios da virtude e as invectivas contra os vícios contrastam estranhamente com sua conduta de vida. No entanto, sabe colocar os fatos importantes em relevo e preterir aqueles que não oferecem interesse. Sua narração não é pesada.

Os discursos que permeiam suas obras, em grande parte inventados, visam pintar as situações e os caracteres. São bem compostos, hábeis, em estilo esmerado. Os retratos caracterizam as principais personalidades.

ESTILO

Seu estilo é conciso, admirável pelo movimento, atraente pela rapidez da narrativa. No entanto, deixa perceber o recurso técnico. Da mesma maneira que Tucídides, é dado à dissimetria - a desproporção -, procura o conceito, frases curtas e cheias. Espalha por todo lado antíteses - exposição de ideias opostas.

A busca do improviso faz com que Salústio evite as cadências rítmicas - as cláusulas - empregadas pela escola de Cícero. Sêneca observou que as frases salustianas terminam quando menos se espera. Mesmo quando longa, a frase não se parece a um período ciceroniano, pois desconhece a cadência harmoniosa, o âmbito, a plenitude.

Os arcaísmos de Salústio foram notados pelos antigos que acusaram-no de ter pilhado os vocábulos do velho Catão. Recorreu a isso, porque queria, custasse o que custasse, afastar-se da língua ordinária, pois o uso de palavras comuns ter-lhe-ia parecido banal.

Além dos arcaísmos reais, como labos por labor, há outros arcaísmos aparentes, como volt por vult, e são exatamente estes que mais impressionam o leitor inexperiente à primeira vista. A ortografia dos seus manuscritos está de acordo com o uso do tempo de Cícero.

REPUTAÇÃO

As obras de Salústio não passaram despercebidas, pois cedo encontraram admiradores e críticos. A sua parcialidade, assim como os arcaísmos foram censurados, porém a admiração sobrepujou à crítica. Quintiliano, embora recomendasse que não se lhe imitasse a concisão, disse poder equipará-lo a Tucídides, e Tácito denominou-lhe de rerum romanarum florentissimus auctor (Annales, III, 30).
Paulo Barbosa.

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