segunda-feira, 29 de novembro de 2010

DEZ BONS CONSELHOS PARA OS ESTUDANTES DE FILOSOFIA

Estudar filosofia não quer dizer necessariamente se tornar filósofo. Ser filósofo é muito mais que possuir coleções de citações, de frases ou mesmo de livros inteiros de filósofos do passado ou do presente. Ser filósofo é, sobretudo, ter uma visão do Ser com reflexão própria. Estes dez conselhos seguintes, se seguidos pelos estudantes de filosofia, com certeza contribuirão para sulcar nestes o espírito filosófico, transformando-os, aos poucos, em verdadeiros amantes da sabedoria. Ei-los:

1. Não transformar em exercício de memória o que deve ser questão de raciocínio. O caráter arbitrário dos programas, das disciplinas, e a lei do mínimo esforço aplicada ao temperamento do estudante propendem, na maior parte dos casos, a burlar o espírito filosófico e a rebaixar as lições ao nível primitivo do psitacismo.
2. Não se fiar em soluções provisórias, mas exigir sempre mais luz. Não temer as objeções, mas ter a coragem intelectual de enfrentá-las e de resolvê-las serenamente.
3. Entregar-se ao estudo particular e aturado dos problemas. Esforçar-se sempre em colocar a reflexão pessoal em cada um dos argumentos e questões. Mudar os exemplos do texto e completar as provas das teses com a investigação individual.
4. Desenvolver dia a dia o poder da crítica e da argúcia. Descobrir as falhas dos autores. Ler outros livros filosóficos para preencher as lacunas e encarar a questão por todos os aspectos. Escrever pequenos ensaios sobre os assuntos que mais o interessa.
5. Respeitar as teorias dos antepassados, compreendendo o ambiente social que as provocou. Acatá-las ainda quando, à distância em que nos achamos, nos pareçam pueris e cheias de nonsense. Saber considerá-las, caso sejam errôneas, como tentativas e etapas do saber. Separar as intenções do filósofo e as consequências dos seus princípios.
6. Não se deixar dominar meramente pela autoridade de quem quer que seja, mas estimar antes de tudo as razões em que se estribam os Mestres. Dar valor ao que é sólido, e não apenas ao que é lustroso e elegante. Não se transformar em simples comentadores dos filósofos, mas procurar, desde cedo, trazer à filosofia uma contribuição pessoal.
7. Começar por se colocar na escola de um Mestre clássico. Como ensina Paul Geny, isso é uma necessidade natural, uma feliz necessidade: "Antes de construir, ou melhor, de estudar como é construído o mundo das realidades interiores e exteriores, nossa tendência instintiva é buscar o que os outros pensaram. Antes de abordar a solução destes grandes e temíveis problemas que se propõem a todo o homem que reflete, olhamos em redor de nós e procuramos um guia, ao menos um iniciador. A lei do nosso espírito é que  se não toma consciência da sua força e não se adquire um pleno desenvolvimento, a não ser ao contato de outros espíritos" (Études, janvier, 1915, página 50).
8. Pensar que a Filosofia, como todas as ciências, tem os seus inícios e desdobramentos, os seus dias obscuros e os seus dias de luz. Ela não é um grande cemitério de doutrinas. Tem os seus estádios, os seus marcos ascensionais. Colocadas de parte as crises e os extravios, é possível estabelecer uma continuidade entre os sistemas que passam, descobrir uma "filosofia perene" ao lado das filosofias efêmeras.
9. Amar a verdade acima da novidade. Non nova, sed vera, não as coisas novas, mas as verdadeiras. É certo que, como lembra Malebranche, é preciso amar a novidade pela mesma razão com que se ama a verdade: é mister procurá-la e ter por ela, sem cessar, curiosidade, porém, ter em mira apenas o caráter original dos sistemas filosóficos é deslocar o eixo da filosofia para o terreno movediço das artes e das modas. Toda ciência exige uma tradição, uma continuidade de esforços, ou como expressava Sertillanges, uma colaboração universal.
10. Especializar-se logo que se tiver um conhecimento global da filosofia. As partes da filosofia são tão vastas que é quase impossível, em nossos dias, adquirir uma ciência enciclopédica e profunda de cada uma delas. Deve-se, então, limitar o campo de trabalho. Amar, sobretudo, a filosofia como uma cosmovisão, uma maneira de encarar o mundo, e aplicá-la a cada momento da existência, torná-la familiar aos atos humanos, ser regra da vida, ou seja, viver a filosofia.

Paulo Barbosa.

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