sábado, 19 de fevereiro de 2011

LITERATURA LATINA (IV): POETAS DO PERÍODO ARCAICO

É no período arcaico, que começa mais ou menos em 240 até 81 a.C., que a influência grega começa a se fazer presente em Roma, e a Literatura Latina desenvolve-se, não espontaneamente, mas por imitação dos gêneros literários que se constituíram entre os povos da velha Hélade. Esta influência foi favorecida por uma parte da aristocracia romana, através do chamado Círculo dos Cipiões, grupo de intelectuais frequentado por gregos, como o filósofo Panécio, o historiador Políbio, e abrigado pela autoridade de Cipião Emiliano e Lélio, e combatida por outros patrícios e até mesmo por plebeus, figurando à frente da resistência Catão, o Antigo.

OS MAIS ANTIGOS POETAS DE ROMA

LÍVIO ANDRONICO

Lívio Andronico
ANDRONICO (280-200 a.C.), grego de Tarento, uma das principais cidades da Magna Grecia, foi levado para Roma em 272 quando sua cidade natal foi tomada pelos Romanos. Na Urbe, foi vendido como escravo, e um romano de nome Lívio o adquiriu, fazendo-o preceptor de seus filhos e mais tarde lhe concedendo a liberdade. Por esse motivo, guardou o nome de seu senhor, Lívio.

Abriu Andronico uma escola onde ensinava o grego e o latim, e foi o primeiro tradutor do Ocidente, traduzindo do grego para o latim a Odisséia, e mais tarde algumas comédias e tragédias. Fez representar em 240 a sua primeira comédia em Roma, e em 207 foi encarregado de compor o hino que cantava a vitória do Metauro, batalha ocorrida na segunda Guerra Púnica pelos cônsules Marco Lívio Salinator e Caio Cláudio Nero.

Parece ter falecido em idade muito avançada.

OBRAS

aODISSÉIA LATINA, uma simples tradução em versos satúrnios, muitas vezes bem prosaicos. A língua latina ainda era bem rude, pois estamos em pleno período arcaico, e por isso, os versos são pouco harmoniosos. No entanto, este foi o primeiro poema inspirado pela influência grega.

bTRAGÉDIAS, das quais de algumas sabe-se os títulos, como AQUILESÁJAXCAVALO DE TRÓIAEGISTO, etc. Todas são traduções do grego e eram representadas pelo próprio Lívio, e quando ficou mudo, gesticulava, enquanto outro declamava.

cCOMÉDIAS, das quais restam apenas fragmentos muito curtos e em pequeno número. Os próprios títulos são duvidosos: LYDIUS [ou LUDIUS?], VIRGO, etc.

O valor literário de Lívio Andronico não é muito original, ou nada original, mas deve-se confessar que prestou a Roma um enorme serviço, tornando conhecida a poesia grega.

GNEU NÉVIO

NÉVIO (264?-194?a.C.), natural de Campânia, de raça latina, foi soldado antes de se tornar poeta, e participou da primeira Guerra Púnica (264-241). Em 235 foi representada a sua primeira peça. Era um homem popular, democrata, e adversário da aristocracia, tendo até mesmo composto contra os Metelos, aristocráticos romanos, o seguinte verso satúrnio: "

"FATO METELLI ROMAE FIUNT CONSULES"

"PARA DESGRAÇA EM ROMA OS METELOS SERÃO FEITOS CÔNSULES"


Ao que responderam os Metelos:

"DABUNT MALUM METELLI NAEVIO POETAE"

"OS METELOS DARÃO MÁ SORTE AO POETA NÉVIO"

Devido a isso, foi Névio preso, mas após sua soltura continuou a atacar a nobreza, e foi obrigado a exilar-se, morrendo em Útica, cidade do norte da África.

OBRAS

Névio produziu em vários gêneros a sua atividade literária:

aTRAGÉDIAS, onde foi ele o primeiro a abordar assuntos romanos: ALIMONIA ROMULI ET REMI (Educação de Rômulo e Remo), CLASTRIDIUM, onde versava acerca da vitória sobre os Gauleses. No entanto, não abandou Névio totalmente os estudos gregos, pois escreveu DANAEEQUUS TROIANUSHECTOR PROFICISCENS, etc.

bCOMÉDIAS, que eram mais originais que as tragédias, contendo alusões mordazes aos contemporâneos, como por exemplo, os Cipiões. Escreveu mais de trinta, dentre as quais destacamos COLAX DEMENTES.

cBELLUM PUNICUM, epopéia em versos saturninos sobre as guerras púnicas, consagrado os quatro primeiros livros à antiga história de Roma, desde Enéias.

O mérito literário de Névio é bem maior que o de Andronico, pois é muito mais original e imita muito menos servilmente. Apesar disso, porém, parece não ter tido talento poético.

QUINTO ÊNIO

Quinto Ênio
ÊNIO (239-169 a.C.), natural de Rúdias, Calábria. Após ter passado alguns anos na Calábria, serviu nos exércitos romanos, vindo estabelecer-se em Roma, onde lecionou grego, e por isso, angariou um grande número de amigos aristocráticos, como Cipião, Flamínio, etc.

Assistiu em 189 da guerra de Etólia, a convite de Fúlvio Nobilior, general romano, onde presenciou a tomada de Ambrácia na primavera do mesmo ano. Em 184 recebeu o título de cidadão romano, e contribuiu grandemente para a introdução em Roma da cultura grega, contra a qual lutava em vão seu antigo amigo e protetor, Catão. Roma era uma cidade esplêndida, próspera e poderosa, e foi exatamente esta grandeza que inspirou Ênio a confeccionar os mais belos versos.

Faleceu devido a gota, doença reumatológica inflamatória que eleva os níveis de ácido úrico no sangue - hiperuricemia -, em 169.

OBRAS

Ênio produziu obras teatrais e exercitou-se na poesia épica:

aTRAGÉDIAS, que foram traduzidas cerca de vinte do grego, sobretudo de Eurípides, e a maioria pertence a assuntos do ciclo Troiano: ANDRÔMACA EM CATIVEIROHÉCUBAIFIGÊNIA, etc.

bCOMÉDIAS, que apenas fragmentos existem.

cTRADUÇÃO DA HISTÓRIA SAGRADA de Evêmero, filósofo grego de Agrigento do século IV a.C., que explicava a mitologia mediante a história e afirmava ter visto os túmulos de Júpiter e de outros deuses. Esta tradução é em prosa, embora não tenha faltado versos, segundo alguns estudiosos.

dHEDYPHAGETICA, obra que trata sobre gastronomia e são conhecidos apenas onze hexâmetros.

eSATURAE, composições em versos de metros variados sobre diversos assuntos como PERFIL DO PARASITAFÁBULA DA COTOVIA E OS FILHOTES, etc. Apesar do nome, não eram satíricas as sátiras de Ênio, nem encerravam ataques a personalidades.

fPOEMAS ÉPICOS, dos quais sabe-se da existência de CIPIÃO, poema sobre Cipião Africano, vencedor de Aníbal e conquistador de Cartago.

gANNALES, em XVIII livros, epopéia em hexâmetros, onde narra toda a história romana. Os livros I-III trata das origens e dos reis; IV-VI, da submissão de toda Itália à Roma; VII-IX, das guerras púnicas; X-XII, da luta contra a Grécia; XIII-XV, da extensão do domínio romano na ÁsiaXVI-XVIII, da própria história de seu tempo.

Dos Anais restam pouco mais de 600 versos ou fragmentos de versos. Neles com muita frequência emprega-se o maravilhoso, sobretudo nas narrações dos fatos antigos. Estes livros gozaram de muita popularidade em Roma, até a aparição da Eneida, que foi a epopéia nacional do povo romano.

O valor literário de Ênio está muito longe da perfeição de um Vergílio. Nesta época, não era ainda a língua latina suficientemente maleável nem bastante suave para que pudesse vir à lume uma obra-prima como a Eneida. Mas, em Roma, com Ênio, pela primeira vez, encontra-se certa inspiração poética, apesar do verso rude, cheio de aliterações, e muitas vezes pesado.

A reputação do poeta, no entanto, foi muito grande. Até o tempo de Cícero, foi Ênio admirado em Roma. Desta época em diante, porém, surgiu uma reação entre os jovens poetas da escola de Catulo, os denominados "poetae novi" ou "neoterói". Não obstante, ainda se buscava muitas coisas nas obras enianas, como, por exemplo, Vergílio, que tomou-lhe não apenas expressões, mas versos inteiros.

O surgimento da Eneida relegou à sobra os Annales, mas Ênio não ficou totalmente sem leitores, pois os arcaizantes o tem em grande conta e estudam-no com afinco, e no século IV e V d.C. ainda era citado pelos gramáticos.
Paulo Barbosa. 

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