quinta-feira, 3 de março de 2011

LITERATURA LATINA (XIV): PERÍODO CLÁSSICO, ERA DE CÍCERO - ELOQUÊNCIA [1ª PARTE]

O período clássico, também denominado áureo, da literatura latina, vai de 78 a.C. a 14 d.C., sendo dividido em duas eras, a Era de Cícero e a Era de Augusto. 

A Era de Cícero abrange de 78 a 29 a.C., e nela floresce sobretudo os prosadores, chegando a prosa ao auge com Cícero e César. Os maiores autores deste período são:

Cícero (106-43 a.C.), apogeu da eloquência e da prosa latina;
César (101-44 a.C.), junto com Cícero é o padrão da prosa clássica;
Salústio (86-35 a.C.), apogeu da historiografia;
Lucrécio (98?-35 a.C.), apogeu da poesia filosófica;
Catulo (87-55 a.C.), poeta e introdutor de variados metros gregos em latim.

A Era de Augusto abrange de 29 a.C. a 14 d.C., florescendo os grandes poetas e o último grande prosador clássico, que são:

Vergílio (71-19 a.C.), apogeu da poesia pastoril, épica e didática;
Horácio (65-8 a.C.), poeta que imitou a mélica e a lírica e introdutor de metros gregos em latim;
Cornélio Galo (69-26 a.C.), criador da elegia romana;
Tibulo (50-19 a.C.), cultivador da poesia elegíaca;
Propércio (47-15? a.C.), cultor da poesia elegíaca;
Ovídio (43 a.C.-17 d.C.), último dos poetas clássicos, e que adentrou a Era Cristã;
Tito Lívio (64-17 a.C.), o último dos prosadores romanos.

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ERA DE CÍCERO

A ELOQUÊNCIA

No século I a.C., sofreu a eloquência romana a influência dos gregos, e em particular dos rétores asiáticos, cujo estilo era muitas vezes sentencioso e rebuscado, e geralmente amplo e redundante. 

Muitos oradores tinham se formado nas escolas de Rodes, onde imperava um gênero análogo ao asiático, porém mais moderado. 

Os mais robustos oradores desta época foram:

QUINTO HORTÊNSIO HÓRTALO

Hortênsio
HORTÊNSIO (114-50 a.C.), foi político e cônsul romano, e além disso letrado e grande orador. Consta que foi o melhor orador de seu tempo até o momento em que Cícero despontou ganhando contra ele a causa de Quíncio, e depois a dos Sicilianos nas Verrinas. No entanto, Cícero conservou-se sempre seu amigo e muitas vezes ambos defenderam juntos as mesmas causas.

Entre as particularidades de seus discursos, nota-se o uso metódico das divisões e da recapitulações, que na época ainda ninguém prestigiara.

Escreveu um tratado de oratória, poemas eróticos e os Annales, que lhe deram reputação de historiador.

A eloquência brilhante a caudalosa de Hortênsio era modelada pelo gênero asiático, mas ao declinar da vida começou a findar, já que tal gênero não se coadunava bem com a idade avançada.

OUTROS ORADORES

Muitas das principais personalidades políticas de Roma eram mestres da palavra, como por exemplo POMPEU (106-48 a.C.), CATÃO DE ÚTICA (95-46 a.C.), e sobretudo MARCO ANTÔNIO (82-30 a.C.), que com seu discurso patético nos funerais de César em 44 a.C. produziu efeito surpreendente na multidão.

MARCO TÚLIO CÍCERO

Cícero
CÍCERO (106-43 a.C.), nascido em Arpino, pequena cidade do Lácio, distinguindo-se cedo pelos sucessos nos estudos. Gostava de frequentar o foro, onde ouvia os grandes oradores com a finalidade de deles aprender a arte e mais tarde poder superá-los.

Aos vinte e cinco anos (81 a.C.), pronunciou seu primeiro arrazoado, o Pro Quinctio; no ano seguinte defendeu uma causa de maior vulto, o Pro Roscio. Era um ato de ousadia em plena era de proscrições atacar um favorito do todo poderoso ditador Sila. Ganhou o processo, e isso foi o bastante para ser incluído no número dos principais advogados de Roma. Sua saúde, no entanto, estava um tanto debilitada, e devido a isso os amigos o aconselhavam a fazer uma viagem pela Grécia e Ásia. Cícero atende-os e aproveitou da viagem para aprimorar-se na arte da palavra com os melhores mestres de eloquência daqueles países, principalmente com Mólon, que lecionava em Rodes. Conseguiu fortalecer-se, e ao retornar para Roma em 77 estava muito mais hábil na arte oratória. Casou-se então com Terência, mulher de caráter desagradável e que não estava fadada a torná-lo feliz.

DE QUESTOR A CÔNSUL  [76-63]

Foi Cícero nomeado Questor em 76, exercendo o cargo em Lilibeu, na Sicília, no ano 75.

Quando foi designado Edil em 70, processou Verres a pedido do povo da Sicília. Pronunciou um breve discurso, em seguida fez ouvir as testemunhas, e Verres foi condenado. No intuito de prolongar os efeitos desta condenação na opinião geral, deu publicidade, em seguida, às Verrinas, discursos que constituem um quadro completo da violências cometidas por Verres na Sicília.

Em 69 foi elevado a Edil Curul, e a Pretor em 66.

Em 63 foi eleito Cônsul, e frustra a conspiração de Catilina, mandando executar os conjurados. Demonstrou muita decisão nesta circunstância, qualidade que não lhe era habitual.

APÓS O CONSULADO - EXÍLIO

Os cidadãos mal intencionados procuraram vingar-se de Cícero, minando-lhe, aos poucos, o crédito. Em 58, Clódio conseguiu fazer votar uma lei que o visava diretamente. Cícero exila-se e aí vive dezoito meses, dominado por grande tristeza e completo desânimo; retorna, entretanto, sob grandes aclamações.

Não durou, no entanto, muito tempo a alegria do regresso. Cedo percebeu Cícero que não gozava nem de poder no Estado, nem de independência. É a época do primeiro triunvirato.

GOVERNADOR DA CILÍCIA E IMPERADOR

Em 51 retirou-se Cícero novamente de Roma, mas desta vez em missão oficial: foi governar a Cilícia. Exerceu o cargo com integridade e desinteresse, o que era muito raro na época (como hoje em dia também). Conseguiu obter alguns sucessos militares contra um pequeno bando de salteadores e foi proclamado Imperator pelos seus soldados. Esperava conseguir, por este feito, o triunfo, mas quando regressou a Roma irrompeu a guerra civil entre César e Pompeu.

Durante largo tempo hesitou Cícero ante a guerra civil, pois nenhum dos dois partidos o satisfazia. Finalmente se decidiu por Pompeu, que pouco depois foi vencido em Farsalo.

SOB A DITADURA DE CÉSAR

Quando César começou a governar, Cícero mostrou-se, a princípio, reservado. César, no entanto, procura obter suas simpatias. Consente então Cícero em se aproximar do ditador, e consegue o perdão para muitos do partido de Pompeu. Tentou também convencer a César a restituir a liberdade de Roma, mas foi inútil.

Em 45 morre sua filha, Túlia. Nessa época, para se acalmar ou se distrair de sua dor, Cícero compõe grande parte de suas obras filosóficas.

MORTE DE CÉSAR E ASSASSINATO DE CÍCERO

Em 15 de março de 44 César foi assassinado. Cícero, que ansiava muito em ver restabelecida a liberdade, aplaudiu a morte do chefe. Dentro em pouco, porém, Antônio pretendera a sucessão de César, e Cícero começa a lutar enérgicamente contra ele. Pronunciou, então, as Filípicas, espalhando-as por toda Itália, e durante meses foi o cabeça da resistência. Mas Antônio entra em entendimento com Otávio, que lhe entregou a sorte de Cícero. Os homens de Antônio alcançaram-no perto de Fórmias, sendo aí decapitado pelo centurião Herênio. Sua cabeça e mão direita foram expostas no foro, acima da tribuna oratória.

CARÁTER

Cícero é dos homens da antiguidade o que mais profundamente conhecemos. A correspondência que deixou permite que se conheça muito bem sua intimidade. Era honesto, de bom caráter, pois numa época em que os grandes senhores roubavam e pilhavam sem escrúpulos as províncias, ele se conservou honesto. Homem de costumes íntegros, quando quase todos se tinham corrompido; de coração compassivo, amável, e jovial conversador.

ELOQUÊNCIA

Foi Cícero o maior orador de Roma. A característica da sua eloquência não é nem o vigor invencível do raciocínio, nem a robustez e sinceridade da convicção, mas um encanto sutil, a que seus ouvintes dificilmente escapavam. A análise descobre nele principalmente:

- Habilidade, tato. Sabia o Orador evitar tudo o que pudesse desagradar aos ouvintes. Sabia ganhar-lhes a simpatia, inculcar-lhes insensivelmente sua maneira de ver. Sabia, enfim, apresentar os fatos, dispor as provas.

- Espírito. Ninguém contestará a Cícero a glória de ser o mais espirituoso dentre todos os romanos de seu tempo. Para quem sabe entendê-los, seus discursos estão repletos de ironias, sátiras virulentas, gracejos amáveis e finos, hábeis e sorrateiramente distribuídos por entre os elogios.

- Pitoresco. Sabia sê-lo nas descrições, nos restratos das personalidades.

- Senso do patético. Triunfava Cícero também neste particular. Sua ação veemente e apaixonada produzia em seus ouvintes poderoso efeito. Esse era o motivo que reservavam-lhe os amigos o encargo de falar por último.

O jovem Cícero tinha grande facilidade de elocução, o que ele mesmo reconheceu mais tarde. Seguia de maneira rigorosa às regras da retórica técnica, e os vestígios disso é visível sobretudo nos primeiros discursos, como no Pro Quinctio e no Pro Roscio Amerino.

Após seu regresso da Ásia, torna mais simples e também mais perfeita sua eloquência. As qualidades pessoais de tato, de finura, de espírito, são desenvolvidas. Seu senso patético é mais sincero.
Paulo Barbosa.

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