Recebi ontem, 01 de março, um questionário com 6 perguntas de alunos graduandos do Curso de Letras Vernáculas da UNEB, Universidade do Estado da Bahia, solicitando-me que o respondesse. Respondi, e agora o divulgo aqui.
Paulo Barbosa.
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De:
Para:
paulotomista@yahoo.com.br
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Professor,
Thiago Costa Oliveira.
Sou graduando do Curso de Letras Vernáculas da UNEB/DCH VI. Estou com um trabalho escolar - trata-se de uma revista, de circulação interna (apenas sala de aula), sobre a România - e, nele, precisaríamos incluir algumas entrevistas. Encontrei seu currículo, acessando seu blog, e pensei em sua ajuda - se possível, é claro! -. Assim, a questão é: poderia responder a esse sucinto questionário que segue anexo?
Desde já, independente ou não de poder nos ajudar, agradeço imensamente.
Thiago Costa Oliveira.
QUESTIONÁRIO
Universidade do Estado da Bahia – UNEB
Departamento de Ciências Humanas – DCH VI / Caetité – BA
Colegiado de Letras Curso: Letras Vernáculas
Semestre: 2010.2 Semestre Letivo: VI Turno: Noturno
Componente Curricular: Língua e Literatura Latinas
Docente: Lucélia Alves Magalhães Silva
Graduandos: Cleonária de Jesus Brito
Graduandos: Maria Eliene Silva Correia Vieira
Graduandos: Thiago Costa Oliveira
Graduandos: Wagner William Risério Fraga
QUESTIONÁRIO
1) A língua latina é estigmatizada, em ensino, pelo preconceito de ser uma língua morta. O que acha da afirmação?
RESPOSTA: Penso ser a afirmação de quem desconhece ter sido o latim a língua de uma grande civilização e que devido a isso sintetiza valores de civilizações anteriores; acredito ser a afirmação de quem desconhece ter a crise intelectual e moral de muitos povos coincidido, quase sempre, com as brechas abertas no ensino da educação clássica; enfim, com toda certeza é a afirmação de quem ignora – ou está de má fé - que o convívio frequente com os grandes vultos do classissismo, seja grego, seja romano, confere clareza do pensamento e da forma, precisão, naturalidade e rigor da expressão, equilíbrio do sentimento, facilitando, mesmo, conforme disse Ruiz Amado em uma de suas obras, a serenidade emotiva, a ordenação da imaginação e a tranquilização do coração.
2) Qual seria a resposta mais precisa para a constante pergunta: Por que estudar latim?
RESPOSTA: Responderia que a principal virtude do estudo do latim, e das humanidades clássicas em geral, é o desenvolvimento harmônico e completo das faculdades humanas, tanto as intelectuais quanto as sensitivas, como a inteligência e a vontade, a memória e a imaginação, fazendo assim jus ao nome de Humanidades. É comprovado que nenhuma outra disciplina possui esta capacidade do latim, qual seja, a de arraigar hábitos de trabalho metódico, de fornecer dinamismo, de ensinar a reflexão. O seu estudo prepara o homem, tornando-o exímio em qualquer campo do saber, ensinando-o a pensar e a conduzir e exprimir o pensamento.
Outros fins que também podem ser acrescentados ao seu cultivo, porém fins menores, em relação ao principal, que é a humanização, são os seguintes:
° Tendo sido o latim elemento fundamental na formação de quase todas as línguas da cultura ocidental, direta ou indiretamente, o seu estudo fornece valiosos elementos para o mais rápido e seguro conhecimento dessas mesmas línguas, sobretudo da nossa língua pátria.
° A finalidade filológica, vigente sobretudo nas faculdades, permite ao estudioso o conhecimento da vida econômica, social e política dos romanos, e através deles, do mundo antigo. Este aspecto cultural é muito importante também, pois coloca o cultor do latim em contato com a civilização romana, donde proveio toda a civilização ocidental.
3) Na sua opinião, qual o lugar do ensino da língua latina no Brasil?
RESPOSTA: O lugar do ensino do latim no Brasil deveria ser de destaque, se caso houvesse uma real política pedagógica de formar os homens com todos os seus potenciais. O latim, por fornecer um aparato crítico, por ensinar a pensar com coerência e a raciocinar com energia, foi sendo deixado de lado, até a sua proscrição total nas escolas brasileiras. Era tido como a disciplina das elites, fator de superioridade e indício de fascismo. Restaurar o latim se faz necessário, se se quiser restaurar o homem, ajudá-lo a vencer a crise de cultura por que passa e a harmonizá-lo em suas potencialidades.
4) Veja o texto[1] a seguir:
“Chegados ao Brasil, ficamos admirados com o cabedal de fórmulas decoradas de matemática com que estudantes brasileiros deixam o curso secundário, fórmulas que na Itália – os três professores eram catedráticos de diferentes faculdades italianas – são ensinadas só no segundo ano da faculdade; ficamos porém, chocados com a pobreza de raciocínio, com a falta de ilação dos estudantes brasileiros; pedimos a vossa excelência que na reforma que se projeta se dê menos matemática e MAIS LATIM no curso secundário, para que possamos ensinar matemática no curso superior”. (Gramática Latina, Napoleão Almeida).
Esse é o teor do ofício enviado ao ministro da educação por três eminentes matemáticos que após os primeiros dias de aula enviou-o ao então ministro na época que cogitava se reformar o ensino secundário. Gostaríamos que, se possível, comentasse a respeito da sugestão dos professores.
RESPOSTA: Conforme já visto, o latim é uma disciplina humanística, causadora, ou melhor, construtora do ideal profundamente humano, devido à formação intelectual e moral que confere. O oposto, ou seja, a eliminação de um acervo construtor do homem, como o latim, permite que se desenvolva homens como os do nosso tempo - pragmáticos, calculadores, imbuídos de fórmulas -, mas de uma superficialidade tamanha no pensamento e na ação, de um desiquilíbrio psíquico estonteante, conseqüência do divórcio no ensino atual da verdadeira educação clássica.
5) Recentemente, em alguns meios de comunicação, foi noticiado que um juiz mato-grossense deixa de lado o latim e usa até letra de música da cantora Kelly Key em suas decisões. Informados acerca do trabalho do juiz, seus colegas do meio jurídico disseram que isso não é a primeira vez que isso acontece, pois ele acredita que sua iniciativa aproxima da sociedade, em uma linguagem que todos entendem. O que acha do caso?
RESPOSTA: Não é o fato do juiz ter deixado de lado o latim nas suas sentenças que deve ser reprovado, pois a língua de Cícero foi já há muito deixada pela maioria dos magistrados por ignorância ou incompreensão tanto deles quando dos advogados. O que é sintomático neste caso é a transgressão à formalidade requerida pelo ato em si, que sempre, desde imemoriais tempos, foi cercado de solenidade e reverência. Penso que isso é índice revelador da tamanha decadência cultural a que chegaram os homens de nosso tempo, infectando até mesmo aqueles que deveriam ser os primores ou optimates da sociedade.
6) Acredita que a disciplina de latim deveria ser obrigatória na Educação Básica. Por quê?
RESPOSTA: É aquilo que eu disse há pouco: se se quiser que os homens se restabeleçam desta crise intelectual e moral por que passam, que se tornem realmente seres pensantes, críticos, verdadeiros homines sapientes, é necessário que se retorne com as humanidades para as escolas. Somente este acervo pedagógico é capaz de humanizar, de formar o caráter, de fornecer ao jovem a justa estima dos valores ideais, a profunda sabedoria da vida e o robustecimento da vontade.
[1] ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Gramática Latina. Curso único e completo. São Paulo: Saraiva, 1993.
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